domingo, 6 de março de 2011

SORTILÉGIO

Demora-se o momento
arrasta-se a hora;
agora
não há imagem nem idéia.
Do fundo da paidéia
no silêncio do incenso,
conjuro o espírito da poesia ,
da mania ,
da arte , do som ;
o dom
da música e da narrativa
para que traga sua bênção criativa.
Ritual de chamamento ,
mágica convocação ,
manifestação na palavra
da sensação .
Sortilégio de espectros
indistintos;
em busca de traços sucintos,
contornos,
rostos,
máscaras de expressão.
Surgem então os primeiros vórtices,
torvelinhos de letras ,
furacões consoantes,
vogais um pouco mais nítidas ,
sedas,
para as vestes líricas.
Vêm ainda perdidas em profusão,
soltas,
loucas,
mariposas em torno do lampião.
Os ventos da criação, agitados,
espalham sílabas pra todos os lados,
em minha cabeça greco - carioca,
toca
onde se estoca a provisão de frases e termos rebuscados
para o inverno branco do papel.
Mel
para meus neurônios cansados,
ansiosos por retirar
do ainda - não - expresso
seu véu.
Riscos à êsmo
cenas ainda turvas, obscuras,
lampejos
que riscam a mente,
que contempla tudo estática,
silente.
A velocidade dos fachos se reduz, então,
desenhando pseudo - perímetros,
ora de quilômetros,
ora de centímetros,
pulsação que propõe
e, em seguida, dispõe
o proposto,
apagando a cena
desfazendo um rosto.
Num minuto julgo 
delinear um vulto;
no outro recuo, confuso,
e aguardo mais um pouco,
até que defina-se o contorno.
O que surge, no entanto, é ainda incerto,
tortuoso,
complexo.
Mais:
duplica-se num reflexo
e amplia-se num outro e negativo universo.
Volta-se sobre si mesmo como Narciso
paralisado por sua própria forma no espelho
e sem que eu fosse a despertá-lo com meu grito
desvanecer-se-ia sem produzir poema ou texto.
(é função do poeta ordenar os espasmos das imagens
para que o caos , transmutando-se em paisagens,
faça que o disperso se condense em verso.)

O poema avança em rodopios redundantes,
perplexo por sua estética errante,
procurando transformar-se em sentido .
E, pasmo, por mais que a situação pareça estranha,
constata que o enredo que se forma,
mostra ,
ainda que de maneira torta,
uma visão panorâmica de suas entranhas.

Então, após este complexo estratagema,
nasce o poema.

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